terça-feira, 7 de outubro de 2014

Entrevista com Matheus Mota (PE)

Matheus Mota - sem sombra de dúvidas - acaba de lançar o melhor disco pernambucano de 2014. Feche o facebook, desligue seu celular, escute o álbum por alguns minutos e tire suas próprias conclusões. Essa peça rara se chama "Almejão", um álbum cristalino, criativo, verdadeiro, limpo e gravado praticamente em casa. Limpo de tudo, de cenas, de lugares, de cara limpa.

Esse é um daqueles álbuns que chamamos de obra e como tal o seu tempo-lugar parece estar no futuro, um ainda "não-ser", um público/mídia que ainda parece não estar no mesmo lugar que ele - e talvez por esse motivo - o lançamento feito essa semana vá ecoar como os bons discos. Conversamos com Matheus via facebook e - para nossa surpresa - ainda não saiu sequer uma matéria impressa do álbum em Recife. Esperemos então o álbum se mostrar aos poucos. Para a coletânea Matheus gravou uma versão exclusiva de "Energias Positivas". Com vocês Matheus Mota.


- Matheus, conta um pouco, como surgiu a coisa da música na tua vida?

Matheus Mota eu tive sorte de ter aula de música na escola, o colégio nóbrega. acho que desde a alfabetização até talvez a segunda série primária. dessa época me despertou - mais ainda - o interesse por aqueles sons inusitados que tocavam nas bolachas da minha sala. daí com 9 anos ganhei um teclado e passei a estudar por conta própria. compor só comecei em 2004 com 17 anos.


Coquetel Molotov 2013


- Como foram tuas primeiras gravações, foi mais ou menos por essa época, 2004?


Matheus Mota eu compunha canções num piano de uma tia, no bairro dos aflitos. meu teclado estava desmontado. na época eu era muito ligado em física, dava aulinhas pra descolar um troco. e destruí o unico teclado que tive, então nao podia gravar. descobri a possibilidade de se gravar discos inteiros com dois nomes da música gaúcha "internetal"... 'os_nerds' e 'the ircers'. eles plugavam a guitarra e o baixo diretamente na placa de som dos seus pentium 2 e programavam baterias midi no guitar pro. nao havia vst nem nada disso, pelo menos não tínhamos acesso a isso. entao eu já gravava versoes de beatles em 2003, publicava em canais do mirc. em 2005 ou 2006 "afrouxei" minha torneira de criação, e gravei 5 discos com 10 músicas cada. evidentemente que boa parte era porcaria, mas isso me ajudou a ajustar o foco.


- E as primeiras apresentações, foram no formato one-man-band?

Matheus Mota sim... eu fiz duas apresentações em 2009. uma em maio em são paulo, no hall do colégio marista vila mariana, acompanhado do amigo gabriel stern. e no segundo semestre, talvez em agosto, abrindo para zeca viana no boratcho, com canções que formariam o meu primeiro ep 'volta ao mundo de bicicleta'. eu havia recém saído da banda malvados azuis. acho que ensaiamos uns 3 meses mas nunca fiz show com eles.






- Então desde o começo você esteve atento nessa ponte-aérea Recife / São Paulo, o que marca também a tua presença na música independente nacional. O que São Paulo representa na tua trajetória?


Matheus Mota à medida que eu fui ganhando 'independência' do mundo, ganhando meu dinheirinho com publicidade e me formando no curso de comunicação percebi o pouco espaço que tinha enquanto iniciante em recife. haveria de 'provar' coisas como todo iniciante tem que fazer, a galera meio que nao acredita de primeira. e fiz essas peregrinações a sao paulo mais a título de pesquisa e viabilizar meus projetos. compus e lancei meu primeiro disco aqui, pelo selo cloud chapel, e estou finalizando o segundo da mesma forma. tenho amigos e raízes aqui há muitos anos. existem interesses pontuais no tipo de sonoridade que eu pesquiso e por incrivel que pareça com pouca associação com a vanguarda paulista. chego em recife, a primeira coisa que dizem é 'itamar assumpção'. isso tem diminuido de 2 anos pra cá, recife tem aos poucos firmado cenas mais independentes, abertas para o lo-fi e tudo mais; porém lutar contra a estrutura, o que as casas de show e os grandes produtores julgam como 'que vende' ainda é uma labuta. pretendo investir muito em recife ainda. pouco a pouco consigo realizar coisas aí, como é o exemplo do meu querido grupo varal.


- Como é a tua relação com a produção audiovisual?


Matheus Mota eu tive um grupo de filme amador, a bafo movies, no inicio dos anos 2000. fiz muitos curtas e até um longa nunca lançado. entao desde 99-2000 eu edito em programas, foi o que acabei fazendo mais na vida. edicao pra publicidade e cinema. mas desde 2004 me afastei da produção de vídeos. tenho o plano de retomar isso em 2015, estou me reequipando e assistin
do muitos filmes. acho que minha música tem muita relação com uma estética de vídeo, televisão e mais recentemente com cinema. essas pesquisas estão bem evidentes no 'almejão'.

    - Fala um pouco sobre a canção "Energias Positivas"


    Matheus Mota é a última música de fiz. ao longo de 2013 só compus umas duas músicas - dedicado à banda e aos arranjos do disco. tenho muito carinho pelo momento que eu fiz essa música, definiu uma fase nova pra mim esse ano, mais centrada, otimista e realista. dedicada pra minha namorada que faz backing vocal nela.


      - Você participou da primeira edição do Recife Lo-fi, assim como D Mingus, Rama, isso já faz quatro anos. O que você acha que mudou de lá pra cá?

      Matheus Mota conheci e pesquisei mais possibilidades musicais. fiz pequenas parcerias, gravei nos discos dos amigos e tb incentivei outros. pessoalmente o recife lo fi foi importante para me deixar mais unido com os músicos do meu bairro, o derby. que coincidentemente foram os que mais me identifiquei, os citados na pergunta.


      - Inclusive o nome Cena Beto surgiu de uma reunião no Derby sobre a O.N.I. Qual a tua relação com essa atual movimentação na cidade?

      Matheus Mota eu prefiro pensar o que sempre foi, uma designação para um momento de movimentação de todos, sem paredes e nem destaques desiguais. me dou bem com todos e já toquei com quase todos. frequentei o bairro de areias bastante, entre 2007 e 2008, porque o estúdio era barato e eu queria gravar um disco de rock progressivo. eu pontuo dois momentos de importância para a cena. os primeiros recife lo-fi, que fizeram o pessoal se conhecer e gravar mais junto; e o festival o.n.i, que teve uma frente de apoio grande do blog outros criticos. carlos gomes vinha sendo principal responsável por essa movimentação nas ações dele ao longo de 2011 e 2012. não podemos esquecer disso. com o lance da matéria do globo rolou uma apropriação da cena pela imprensa, que claro não só não se aprofundou como também nao recebeu informações da abrangência do grupo. entre erros e acertos acho que a tendência é cada vez novos artistas surjam à medida que a poeira baixa. um deles é o petrônio.
      Gravações do novo álbum "Almejão"

      - Mesmo você sendo um dos nomes de destaque entre os próprios músicos da cidade e com um público bastante fiel, nunca rolou convite para o Abril Pro Rock e RecBeat. Como você vê isso?
      Matheus Mota sinceramente não sei. sempre frequentei esses festivais e gosto do poder de agregar publico grande que eles têm. acho que eu nao estive na agenda estética deles, não era o momento pra ELES. nao tem nada a ver com imaturidade ou 'não comunicar'. em 2013 o nosso grupo era, dos amadores, o mais amarrado e pronto para fazer um bom show em qualquer oportunidade que nos dessem. ralaríamos um pouco pra um show grande, mas iria rolar. talvez esses festivais formadores de opinião devessem resgatar um costume histórico de recife de abrir para o publico uma música atrelada à nao-normalização, à pesquisa e à crítica, seja ela política/social ou irônica. vejo um decaimento por conta de quererem formatos já fechados e de grupos que ao meu ver às vezes não estão muito preparados pra mostrar algo interessante. a reclamação do publico que curte rock, por exemplo, não é coisa de doido.


      - Como foi o processo de gravação do seu segundo disco lançado recentemente, o "Almejão"?


      Matheus Mota ele foi gravado em recife e sao paulo entre meados de 2013 e meados de 2014. toquei a maioria dos instrumentos e o disco teve participações de fred lyra, rodrigo padrão e henrique correia nas guitarras em 3 faixas; luciano emerson leite nos saxofones, clarinetes e algumas flautas; aline borba nas flautas; aninha martins no vocal de uma faixa, piro bairiano no violão e viola caipira em duas faixas. nao poupei esforços pra gravar tudo o que eu queria, um disco com tratamento de sopros em algumas faixas. diferentemente do desenho, que gastei 60 reais no estudio proclo, o almejão foi um disco 100% free. gravei vocais no estudio da AESO Barros Melo e os sopros na pé de cachimbo, home estudio de dmingus. 'almejão' é uma expressao do meu amigo caio muller, de sao paulo, referente a um cara que almeja muito. mas é algo como determinação fora-da-realidade. voce se cria à partir das suas metas, sem necessariamente ter experiencia nem capacidade em nada. é diferente de 'pretensioso', onde o cara simplesmente não se esforça pra atingir a qualidade das ações.

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